quarta-feira, 1 de julho de 2009

Sol da meia-noite


Acabado de chegar a casa após um ímpeto semi-súbito de correr, correr brutamente sem necessitar do estímulo auditivo de Metallica ou similar agressividade apesar do inegável cansaço físico subsequente a um par de semanas levadas de Belzebu, em que o negro da Noite me pareceu tão claro, brilhante como a única estrela que espreitava, tímida, junto da Lua em fase crescente; em que, rapidamente, todos os problemas deixaram de existir, rasgada e atravessada que foi a discreta fímbria que separa as hipóxia e anóxia cerebrais, desviando também a glicose das vias arteriais superiores em direcção aos latejantes músculos locomotores, fantástica forma de refrear pensamentos e sentimentos penosos; em que as recém-alimentadas entranhas, vizinhas de um espremido miocárdio, palpitado sempre a mais de 90% da sua frequência contráctil máxima por minuto, clorídricas até mais não, decidiram rebrindar-me com uma golfada das antes deliciosas sopa e fruta, refluindo na orofaringe e retornando ao chocalhante saco gástrico, contributo importante ao olvidamento da parte metafísica do ser; em que a contracturada algia da "pata de ganso" esquerda, padecimento já crónico, não macerou verdadeiramente, desligadas que estavam as vias aferentes ou embebida que se encontrava já a massa craniana em endorfinas, tal como não importunaram os pulmões, mortinhos por oxigenar fora da caixa a que pertencem mas que mantive fechados para não me arruinarem o aerodinamismo da NikePro nova, ou os lactatos que picavam a actina e miosina mas que, antagonicamente, os aliviavam, cerebrozinho incluído, pela produção reflexa dos opióides; em que não importou a amaurose fugax, que o caminho não tinha obstáculos e o fim da subida era já ali; em que não importa as menos de cinco horas que dormirei para amanhã enfrentar a 4a urgência em 7 dias.
Bolhas? Músculos? Articulações?, hoje doem mas não doem, aliviam e bem.
Uns goles de água valentes, para diluir a CK massiva e ajudar a na depuração da creatinina, e sigo para o duche quente, sem hora para acabar, etapa final que é da purga, em que as excrescências sodicoureicas cloradas da alma vão cano abaixo.

And now I am...
"I'm weightless
I'm bare
I'm faithless,
I'm scared"
...


Nada a ver com as ondas que chocaram de encontro aos meus tímpanos, aproveitando agora para (vos) recordar da que mais mexeu com os suprarreferidos hoje. Fischerspooner - Door Train Home, do álbum Entertainment

3 comentários:

Sahaisis disse...

espero que a libertação de endorfinas subsequente o deixe grato pela extraordinária força de efectuar tal corrida...agora deixe-me que lhe diga que me surpreende em si a presença de um miocárdio..oh diabo...

Anónimo disse...

Xu-friend...Quantas vezes a noite arrasta com ela o impulso do enfodipensamento...q gera esse ímpeto louco de correr até mais não..como se o ar nocturno expurgasse todas as fodas intelectualoemocionais através mirramento muscular ensandecido...e corre-se...e vem até aquele alheamento estupidamente (in)doloroso......................................................... Mas olha... R/ "agachamentos sticais";)

Shiro de espadas disse...

Em efectivo. O sol da meia-noite virou artéria e com violência lhe queimava as têmporas, num tom ameaçador de acidente.
Depois da tão almejada passagem pelo purgatório aquático; nu e em frente a uma televisão que só cuspia dialectos de vazio, ele... deixava-se flutuar, desprendido como uma carcaça éterea tão aflita de cansaço.
O sulco no sofá era já tão grande que parecia querer dissolvê-lo num só trago. Ele não se importava com isso; afinal, a ideia de se sumir num qualquer interstício de esponjas e molas até lhe aprazia o espírito... mas o que lhe apetecia mesmo era foder; mendigar nos braços daquela mulher que só poderia ser sua, se não nesta, então numa outra vida; seja! fosse! Mendigar por um orgasmo, por um outro lugar onde tão bem se respira o sufoco que pende dos corpos, onde o limite é fonte extrema de loucura. Fonte suprema de alvura promíscua, necessária e tremendamente aditiva. Ele queria amá-la; já, ali, sem estribeiras ou demoras, num só fôlego inteirar-se com ela... Amá-la com o egoísmo feroz de quem procura matar uma ânsia que carrega no peito há mais do que tempo aceitável, ainda que esse tempo tenha dias; "tivesse minutos e seria o mesmo! Puta de vida, nem tempo há para se Ser em conjunto."
Sobrava-lhe a água na testa enquanto a estática abundava nas entranhas da televisão...
Esgotado, desta vez resignou-se. Fechou os olhos e adormeceu.
----------
Desculpa pai, mas não resisti a continuar-te o texto.